Força-tarefa da Lava Jato defende que indulto não seja estendido para crimes de corrupção
A força-tarefa Lava Jato do Ministério Público Federal no Paraná encaminhou, nesta quinta-feira (16), ofício ao Conselho Nacional de Política Penitenciária e Criminal (CNPCP), no qual faz sugestões sobre a extensão do indulto natalino realizado anualmente pelo Presidente da República. A iniciativa decorre da preocupação com a impunidade da corrupção, identificada durante a Lava Jato e outras grandes investigações.
O indulto é o perdão das penas de criminosos e, caso mantidos no futuro os critérios do último decreto (nº 8.940/16), diversos réus condenados por crimes gravíssimos na operação Lava Jato cumprirão penas irrisórias ou serão beneficiados com a extinção da punibilidade. O pedido dos procuradores é de que o indulto não se estenda aos crimes de corrupção em sentido amplo, bem como aos crimes de lavagem de dinheiro e pertinência a organização criminosa (ou associação criminosa), constando vedação explícita, no decreto, da aplicação do indulto nesses casos. Se essa sugestão não for acatada, a força-tarefa propõe que tais crimes sejam, pelo menos, equiparados a crimes praticados com violência ou grave ameaça e não estejam sujeitos a benefícios etários vinculados ao indulto; e, ainda, que a concessão do indulto em crimes contra a administração pública seja condicionada à reparação do dano causado pelo condenado, ou à devolução do produto do ilícito praticado, com os acréscimos legais, a fim de garantir minimamente os direitos da sociedade brasileira, que é vítima da grande corrupção. A força-tarefa já tinha demonstrado preocupação em relação ao assunto no ano passado e chegou a encaminhar algumas sugestões ao CNPCP. Com base no indulto de 2016, os procuradores reforçaram que um condenado por corrupção a 12 anos de prisão, se fosse primário, seria indultado após cumprir 3 anos; já um condenado por corrupção a 12 anos de prisão, também primário e com mais de 70 anos de idade, seria indultado após cumprir apenas 2 anos.
Isso, somado às outras dificuldades de punição, tornaria a corrupção um crime de baixíssimo risco. Para ilustrar a preocupação com o decreto de 2016, um levantamento preliminar – com base em decisões proferidas pela Justiça Federal no Paraná e pelo Tribunal Regional Federal da 4º Região (TRF4) – apontou que, pelo menos, 54 réus, já condenados a penas privativas de liberdade inferiores a 12 anos na Lava Jato, poderiam ser beneficiados.
As recomendações foram acatadas pelo CNPCP, entretanto totalmente desconsideradas pela Presidência da República ao editar o decreto nº 9.246, de 21 de dezembro de 2017. Nele, o presidente Michel Temer reduziu ainda mais o percentual de cumprimento de pena exigido para a concessão de indulto aos condenados por crimes sem grave violência ou ameaça, entre eles a corrupção, para 1/5 da pena se não reincidentes e 1/3 no caso de reincidência, sem fixar limite máximo de pena para a aplicação do instituto.
Ou seja, o condenado por corrupção, se primário, teria direito ao indulto com o cumprimento de tão somente 20% da sanção restritiva de direito à qual foi condenado, independentemente do montante total de pena. Além disso, o decreto declarou que o indulto e a comutação alcançariam também a pena de multa, ainda que houvesse inadimplência, sendo o indulto concedido independentemente do pagamento de multa e da condenação pecuniária de qualquer natureza.
O conteúdo do decreto não passou despercebido pelos réus da operação, conforme se verificou, por exemplo, nos casos das condenadas Nelma Mitsue Penasso Kodama e Iara Galdino da Silva. Dois dias após a publicação do indulto, seus advogados encaminharam pedidos de extinção de punibilidade.
Os efeitos do indulto de 2016 só foram suspensos após decisão, em regime de urgência, do Supremo Tribunal Federal (STF) no dia 28 de dezembro, já durante o recesso forense. No julgamento da Medida Cautelar na Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 5.874/DF, proposta pela Procuradoria Geral da República (PGR), a ministra Carmen Lúcia proferiu decisão destacando que “o ato presidencial tinha se distanciado da finalidade constitucionalmente estatuída, esvaziando a jurisdição penal, e afrontou o princípio da proporcionalidade, vinculada à proibição de se negar a proteção suficiente e necessária de tutela ao bem jurídico acolhido no sistema para garantia do processo penal, especialmente em relação aos chamados crimes de colarinho branco”.
Após o recesso, o ministro Luiz Roberto Barroso, relator do caso, fixou balizas mínimas para a aplicação do instituto, suspendendo parte dos efeitos do decreto nº 9.246, entre eles a concessão de indulto para crimes de corrupção e lavagem de dinheiro, ocultação de bens, peculato, concussão, tráfico de influência, os praticados contra o sistema financeiro nacional, os previstos na Lei de Licitações e aqueles incluídos na Lei de Organizações Criminosas. Em sua decisão, o ministro ressaltou “a aparente leniência do direito brasileiro com a criminalidade do colarinho branco e o não acolhimento, pelo excelentíssimo senhor Presidente da República, de pontos que constavam na proposta encaminhada pelo CNPCP”.
Impunidade – Neste ano a força-tarefa destaca na carta enviada ao CNPCP que as sugestões apresentadas não causariam impacto na população carcerária. De acordo com o “Mapa do encarceramento: os jovens do Brasil”, publicado pela Secretaria-Geral da Presidência da República em 2015, os crimes contra a administração pública cometidos entre 2008 e 2012 correspondem a apenas 0,4% dos presos.
Isso significa que, além de não contribuir para a redução da crise de vagas do sistema penitenciário, o indulto da corrupção teria efeitos perniciosos, pois a probabilidade de efetiva punição da corrupção, no Brasil, é baixa. A pena mínima é, em geral, de 2 anos, sabendo-se que a dosimetria da pena parte do mínimo legal e dificilmente se distancia dele. Penas inferiores a 4 anos admitem, inclusive, substituição por penas alternativas à prisão, como prestação de serviços à comunidade e doação de cestas básicas.
Nesse contexto, conforme destacam os procuradores, “a aplicação do indulto à corrupção retiraria ainda mais o potencial efeito dissuasório da pena, sem contribuir de modo relevante para a redução do problema da superpopulação carcerária. Em outras palavras, não traz benefícios, mas traz malefícios”.
Fonte: publicabrasil.com
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