Conversando com... Benoît Hervieu
Repórteres Sem Fronteiras aponta ‘coronelismo’ contra mídia
Do portal Terra
A organização Repórteres Sem Fronteiras
(RSF) apresentou, em seu recente relatório, um preocupante panorama da
liberdade de imprensa no Brasil. O País consta entre as cinco nações
mais perigosas do mundo para se exercer a profissão de jornalista. Em
2012, cinco profissionais foram assassinados – dois deles, ao que tudo
indica, foram mortos por investigar casos de narcotráfico.
Em entrevista para a DW Brasil,
Benoît Hervieu, diretor do escritório para as Américas do RSF, disse
que a impunidade é um dos principais fatores para a onda de violência
contra os profissionais do jornalismo no País, mas não o único. Outro
problema citado é a censura prévia por parte da Justiça, o que seria
uma “herança do coronelismo brasileiro”. “Isso porque há uma ligação
muito forte entre o poder judiciário estadual e os governadores,
senadores, etc.”, afirmou.
DW Brasil – Qual o balanço do relatório deste ano sobre a liberdade de imprensa no Brasil?
Benoît Hervieu - O
número de mortos deste ano faz com que o Brasil seja considerado o
segundo país mais perigoso do continente para o trabalho do jornalista,
depois do México. Foram onze jornalistas assassinados no Brasil, sendo
que cinco dos casos têm relação direta com a profissão. Dois desses
jornalistas investigavam o narcotráfico na fronteira com o Paraguai,
então estavam claramente expostos ao perigo. A cobertura das recentes
operações contra o crime organizado às vésperas da Copa do Mundo e das
Olimpíadas também expõe os jornalistas. Outra causa de mortes são as
vinganças políticas. Muitos jornalistas no Brasil fazem militância
política, e é difícil saber onde está o limite entre a atividade de
jornalista e de político.
Quais são as regiões mais críticas?
Benoît Hervieu – Tradicionalmente
são os Estados localizados no Norte e no Nordeste do Brasil, onde os
jornalistas são expostos à insegurança, à presença do narcotráfico e a
uma pressão política muito forte. Tudo isso faz com que seja difícil
realizar o trabalho de forma independente e com as mínimas condições de
segurança fora dos círculos tradicionais da imprensa, que é bastante
poderosa, mas também bastante controlada.
A impunidade pode ser considerada um problema?
Benoît Hervieu – É um
dos fatores, mas não o principal. A situação da impunidade no Brasil
talvez seja menos grave do que em outros países onde os crimes não são
investigados, como México, Honduras e Colômbia, por exemplo. O problema
no Brasil é que, muitas vezes, os executores dos crimes são presos,
porém, prender os autores intelectuais (mandantes) é muito mais
difícil. Além do mais, a impunidade depende da região brasileira.
O governo tem feito progressos quanto à liberdade de imprensa no País?
Benoît Hervieu – Houve
avanços durante os dois mandatos do ex-presidente Lula. E também a lei
do acesso à informação, que é um fator muito importante. Eu diria que a
principal questão no Brasil não é o problema da liberdade de imprensa
ou de informação, mas os obstáculos da imprensa para informar. A
concentração midiática é muito grande, e alguns veículos de imprensa da
sociedade civil têm pouco espaço para se expressar.
Existe censura no País?
Benoît Hervieu – Sim.
Uma questão muito frequente no Brasil é a censura prévia, isto é,
quando um veículo de comunicação ou um blogueiro não podem publicar uma
notícia contra um político, porque um juiz proibiu. Isso devido a uma
ligação muito forte entre o poder judiciário estadual e governadores,
senadores etc. Esta é uma herança do coronelismo brasileiro. Muitos
jornalistas me contaram que no Maranhão, por exemplo, falar mal da
família Sarney é quase impossível. Se isso ocorrer, você terá que fechar
o seu jornal ou vai sofrer censura dos juízes. Essa concentração local
de poderes faz com que seja muito difícil existir um contrapoder por
parte dos veículos de informação.
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